terça-feira, 13 de outubro de 2009

Fanfics e oficinas literárias




VARGAS, M. L. B. O fenômeno fanfiction: novas leituras e escrituras em meio eletrônico. Passo Fundo: Ed. Universidade de Passo Fundo, 2005.


O livro de Maria Lúcia Vargas, resultado de sua pesquisa de mestrado, é uma leitura deliciosa e ótima para romper com alguns preconceitos com respeito ao gosto pela literatura de massa. Afinal, quem não começou sua jornada no mundo das letras por tais caminhos? Pra já ter iniciado com profundidade só mesmo sendo muito chato, com o perdão do trocadilho...
Em seu estudo, Maria Lúcia traça inicialmente uma história da fanfiction nos Estados Unidos e depois se debruça sobre o fenômeno no Brasil, procurando compreendê-lo como uma forma de letramento literário. Isso é possível porque nos sites de fanfic (como se costuma escrever no meio) ocorre a prática de reescritura de obras literárias por parte de seus fãs (daí advindo a expressão) acompanhada e orientada por membros mais experientes da comunidade - que ajudam os iniciantes discutindo os textos, fazendo críticas, dando sugestões e até mesmo, em alguns casos, censurando-os...
Entre as dez práticas pesquisadas inicialmente por Henry Jenkis nas comunidades do gênero nos Estados Unidos e citadas por Maria Lúcia Vargas em seu estudo, aponto para a utilização de oito. Os professores poderão aproveitá-las tanto para exercícios de reescritura de textos de literatura de massa – ao gosto dos alunos – como de obras canônicas, assim como para a prática de escrituras e reescrituras de textos dos próprios oficineiros, independentemente de seguir qualquer modelo literário já existente (como acontece no universo das fanfictions):

1) Recontextualização: consiste na escrita de narrativas que preenchem lacunas existentes no texto original.
2) Expansão da linha temporal: consiste na escrita de narrativas cuja ação está aquém ou além da linha de tempo da narrativa original.
3) Refocalização: consiste na escrita de narrativas que centram sua história em um personagem secundário na trama original.
4) Realinhamento moral: consiste numa refocalização levada ao extremo na medida em que “o universo moral do texto original é questionado ou mesmo invertido (VARGAS, 2005, p. 64). Aqui se abre a perspectiva para o trabalho com a paródia.
5) Troca de gênero: consiste na escrita de narrativas em que se mantém os personagens e demais elementos da narrativa original, mas se troca o gênero, passando, por exemplo, de drama ou romance (entendido aqui como história de amor) para comédia ou sátira. Aqui também se abre a perspectiva para o trabalho com a paródia.
6) Narrativas cruzadas (ou cross overs): consiste na escrita de narrativas que cruzem (misturem) histórias de diferentes livros.
7) Deslocamento de personagens: consiste na escrita de narrativas em que ocorre o deslocamento de personagens de uma série ou obra para o contexto de outra obra ou série.
8) Intensificação emocional: consiste na escrita de uma narrativa em que os personagens passam a viver um conflito novo e intenso, que não se encontra necessariamente no texto original.
Para quem quiser saber mais sobre o universo das fanfictions nos Estados Unidos e no Brasil, assim como sua importância para o letramento literário, fica o convite para a leitura do livro.

Marciano Lopes