quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Publicações on-line X Publicações impressas

Com a possibilidade de qualquer usuário conectado à internet criar gratuitamente contas de e-mail e páginas com seu perfil (onde podem ser disponibilizados diferentes mídias), blogs, “canais de TV” (no You Tube) e comunidades em sites de servidores ou de relacionamento, tal como o Orkut, além de poder postar sua opinião sobre qualquer assunto em fóruns, blogs e sites ou até mesmo seu texto literário em sites que funcionam como revistas eletrônicas, criou-se uma "cultura de participação" (JENKIS apud VARGAS, 2005) e do “faça você mesmo”, cujo fruto mais significativo talvez seja a Wikipédia. Se não considerarmos o aspecto das vendas – e do consequente retorno financeiro ao autor – no que diz respeito ao sistema de produção e circulação da literatura em uma sociedade capitalista, é possível considerarmos que a internet tornou possível a qualquer pessoa editar e divulgar seus textos sem ter que passar pela intermediação das editoras, distribuidoras e livrarias, assim tornando-se um autor no mercado dos bens simbólicos do campo literário. O que, é claro, não quer dizer que esse autor vá ser (re)conhecido, pois, no mínimo, é necessário alguma estratégia de divulgação/promoção que leve as pessoas ao seu site ou blog “a fim de que o texto publicado não fique num túmulo internético”, conforme observa, com razão, José Luis Jobim (2005, p. 129). Mas isso não é argumento contra o fato de a internet abrir espaço para qualquer um publicar-se, pois o mesmo pode ocorrer com a produção independente ou até mesmo com aquela feita por alguma editora (re)conhecida que “carimbe o passaporte” para o campo literário – carimbo que nem sempre é uma garantia de qualidade. Sistematizando, portanto, as vantagens que o meio da web apresenta com relação às publicações impressas (sejam feitas por editoras ou gráficas, de modo independente), arrolamos os seguintes aspectos:

1. Acesso amplo à publicação - A web disponibiliza novos espaços de publicação – sejam blogs, disponíveis gratuitamente para o internauta (mesmo os pouco experientes), ou sites. Nesse formato é que, em geral, se encontram as revistas literárias. Para publicar, o usuário pode apresentar seu texto para ser avaliado pelos editores ou, após cadastrar-se e receber uma senha para administrar o espaço que lhe é disponibilizado, inserir por conta própria seu texto – que estará on-line em questão de segundos, conforme a velocidade de conexão.
2. Edição de revistas com baixíssimo custo para os editores – A criação de sites que funcionem como revistas eletrônicas tem custos extremamente baixos, limitados à manutenção de servidor e domínio, além da aquisição de softwares que sejam necessários ao trabalho de edição.
3. Alcance mundial de público - A publicação de impressos (livros, revistas, etc.) necessita de distribuição, que no caso brasileiro sempre é muito limitada. Basta lembrar que o número de livrarias e bibliotecas no país é extremamente irrisório – para não se dizer ridículo. Em contrapartida, publicar no ciberespaço é ter a garantia de ser lido em qualquer lugar do planeta que tenha um computador conectado à web.
4. Interatividade autor-leitor no processo de criação - A publicação no ciberespaço possibilita uma interação com os leitores através do espaço de comentários, fóruns ou chats, o que não acontece quando o escritor publica apenas pelo meio impresso. No caso da publicação de um romance em blogs ou sites, assim como se fazia nos folhetins dos jornais nos séculos XVIII e XIX, o autor tem a vantagem de acompanhar diretamente os comentários dos leitores e de interagir/dialogar com eles durante o processo de escritura. Um caso exemplar e surpreendente, além dos sites de fanfictions, é o experimento de elaboração da comédia policial Os anjos de Badaró, de Mario Prata, escrita com a colaboração dos leitores de seu site (http://marioprataonline.com.br) durante seis meses.
5. Recursos multimídia - Uma revista eletrônica (assim como um e-book) pode dispor de recursos tais como imagens em movimento, vídeos e arquivos de som, além dos hiperlinks, o que no caso de uma publicação impressa não acontece - salvo outras mídias lhe acompanhem como encarte, mas isso não garante uma interação orgânica de imagens e sons com o texto, ou seja, a incorporação dessas outras linguagens na estrutura do texto.
6. Criação de redes de afinidades entre escritores e/ou leitores – A publicação em sites ou blogs possibilita através de links com outras publicações ou autores afins o estabelecimento de redes, o que favorece a divulgação do trabalho e o estabelecimento de comunidades de produtores e leitores. Exemplos são o Portal Literal (cuja curadoria é de Heloísa Buarque de Hollanda) e o blog As escolhas afectivas, criado pelo argentino Aníbal Crístobo, e que propõe uma curadoria autogestionada de poesia “de forma que um autor publique seus poemas e também mencione outros autores, que, por sua vez, farão o mesmo” (GUADALUPE, 2008, p. 698).

É claro que há algumas desvantagens, mas são bastante reduzidas e relativas. A mais evidente é o fato das publicações on-line serem bastante fugazes, ou seja, a garantia de perenidade dos textos digitais é muito menor do que aqueles impressos. Basta que o site ou o servidor desapareça para que se perca a(s) informação (ões) nele depositada(s). Mas essa desvantagem, quando confrontada com as inúmeras vantagens, não é tão relevante, até porque há formas de "driblar" esse perigo (publicando em diferentes espaços ou arquivando os textos para publicá-los novamente em outro, caso se perca o sítio original). Além do mais, a pequena tiragem de livros (pensemos nas edições esgotadas, o que não acontece jamais com um texto on-line) e o difícil acesso a eles parece ser um obstáculo bem maior.

Marciano Lopes e Silva
Referências:

GUADALUPE, A. A literatura brasileira em tempos de internet: blogs, microblogs e outros logs. In: SILVA, M. L e. et all. (org.). II Conali. Anais. Maringá/PR:UEM. 2008. p. 693-703. (CD-Room)

JOBIM, J. L. Autoria, leituras e bibliotecas no mundo digital. In: JOBIM, J. L. (org.). Literatura e informática. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2005. p. 115-131.

VARGAS, M. L. B. O fenômeno fanfiction: novas leituras e escrituras em meio eletrônico. Passo Fundo: Ed. Universidade de Passo Fundo, 2005.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Pequena Morte - Revista de Literatura e Artes

A pequena morte, editada desde 2006 a partir do Rio de Janeiro, sob a coordenação de Hugo Langone e Raquel Menezes (Universidade federal do Rio de Janeiro) dedica-se à divulgação de ensaios, traduções, poesia, entrevistas e artes plásticas. Em 2008, para assinalar dois anos de existência, publicou uma antologia de poesia e ensaios impressa, em cujo elenco se encontram Eucanaã Ferraz, Gastão Cruz, Leonardo Gandolfi, Luis Maffei, Pedro Eiras, Manuel de Freitas, Rui Pires Cabral, Ana Luísa Amaral, entre outros. Segue abaixo o editorial de seu número 18.

Editorial

Mais do que nunca, a literatura vem perdendo seu caráter ontológico e se afirmando como um termo extremamente funcional. Se, mesmo em tempos diferentes, os trabalhos literários outrora partilhavam princípios comuns, agora vemos uma confluência de certezas e experimentações, num movimento que torna cada vez mais difícil o trabalho dos críticos.

De forma especial, a edição #18 da revista pequena morte. vem ilustrar este cenário. Em primeiro lugar, traz o complexo mar em que desembocam os rios de tantas épocas, sob, claro, o olhar de nossa contemporaneidade: Claudio Duffrayer resgata as metamorfoses de Clarice e Raduan Nassar para levá-los até Pedro Abelardo; Mariana Bandeira visita Arthur Schnitzler, Viena e as crises do homem moderno; enquanto Ricardo Pinto de Souza, nosso colunista, caminha entre conceitos e a Madonna de Stalingrado, para chegar, enfim, à velha aura benjaminiana.

No entanto, a confusão (exagerada ou não, tanto em sua origem, quanto na forma de encará-la) não nos tira a vontade do novo e a vontade da escrita, e novas lenhas são sempre jogadas à fogueira do problema. Prova disso são as resenhas de Pedro Lopes de Almeida e de Luis Maffei, feitas a Pedro Eiras & Nuno Barros e a Rui Pires Cabral, respectivamente. Tudo isso acompanhado dos traços de Mirella Farias e pelas declarações de Neil Bresner, entrevistado canadense que, com sua atuação junto a universidades de todo o mundo, fomenta o pensamento crítico nesta realidade de interrogações.

Se é cada vez mais complexa nossa posição em meio a tantas literaturas e linguagens, que ela ao menos nos ofereça um inevitável transbordamento da dimensão humana carregada pela arte. Boa leitura a todos!
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Nosso agredecimento a Pedro Lopes Almeida, estudante da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (Portugal), pela colaboração.