Conversa de passarinhos (Iluminuras, 2008), de Alice Ruiz S. e Maria Valéria Rezende. Um convite para jovens leitores
Alice Áurea Penteado Martha
Conversa de passarinhos, haicais de Alice Ruiz e Maria Valéria Rezende, é mesmo um canto de aves sussurrado aos leitores. A temática surge de uma espécie de inventário de pássaros, um jogo lúdico com palavras que nomeiam aves brasileiras. Embora os haicais, estruturalmente, assemelhem-se a composições simples, de leitura fácil, a síntese exigida nos atos de compor e de ler esses três versos pressupõe vários níveis de leitura. A forma poemática é rígida e o tema deve ser também único: os haicais compõem-se de dezessete sílabas, em grupos de cinco, sete e cinco, cantam elementos da natureza e a influência deles no espírito do poeta.
Os haicais de Ruiz e Rezende confirmam, com rigor, os elementos formais, sem perder a delicadeza e a força poéticas. São versos, sem títulos, cujo trabalho de composição concilia a tradição dos versos japoneses à inovação, a forma exigida com a possibilidade de uma criação livre, propiciando a reflexão a respeito da relação de sentimentos entre homens e natureza:
silêncio na mata
um grito corta a tarde
quero quero
(ARS, 2008, p.47).
tudo é silêncio
acordei tarde demais
para ouvir sabiás
(MV, 2008, p. 47)
Os versos, despojados de adereços, entendidos como “expressão poética”, são brancos, não revelam preocupação com esquemas de rimas, apenas com a valorização da sonoridade; a preocupação do poeta, qual cronista versejador, é tão somente com a difícil captação da fugacidade do instante; ausência de adjetivação em favor de forte predomínio do substantivo que nomeia seres alados: curiós, periquitos, quero-queros, bem-te-vis, pardais, sabiás, entre tantos outros:
pensa e pende
pousa e passa
periquito
(ARS, 2008, p.67)
acordei tarde demais
para ouvir sabiás
(MV, 2008, p. 47)
Os versos, despojados de adereços, entendidos como “expressão poética”, são brancos, não revelam preocupação com esquemas de rimas, apenas com a valorização da sonoridade; a preocupação do poeta, qual cronista versejador, é tão somente com a difícil captação da fugacidade do instante; ausência de adjetivação em favor de forte predomínio do substantivo que nomeia seres alados: curiós, periquitos, quero-queros, bem-te-vis, pardais, sabiás, entre tantos outros:
pensa e pende
pousa e passa
periquito
(ARS, 2008, p.67)
passa e fica
na poça, sem pressa
a lavandisca
(MV, 2008, p. 67)
na poça, sem pressa
a lavandisca
(MV, 2008, p. 67)
basta um galhinho
e vira trapezista
o passarinho
(ARS, 2008, p. 19)
e vira trapezista
o passarinho
(ARS, 2008, p. 19)
centro da foto
mas fora de foco
voo do sabiá
(ARS, 2008, p. 37)
Sentimentos e sensações do eu poético, nos haicais de Ruiz e Rezende, são apenas sugeridos; os versos, em razão disso, podem parecer sem sentido, inacabados, solicitando mais intensamente o diálogo com os leitores:
rede de pescador
sem interromper o voo
o pássaro almoça
(ARS, 2008, p. 29)
O projeto gráfico-editorial de Conversa de passarinhos, de Ruiz e Rezende, também se mostra muito bem realizado. O azul escuro da capa é atenuado por pequenas figuras de pássaros, em tons alaranjados, pousados delicadamente no subtítulo, “Haikais para crianças de todas as idades”, como a sublinhar a amplitude dos leitores desejados. Na contracapa a emoção do sabiá, no haikai de Ruiz, dialoga com a do curió, nos versos de Rezende, ambos voltados para o sol. A delicadeza do conjunto da obra impressiona os sentidos do leitor: versos e ilustrações têm a mesma tessitura. A leitura visual dos poemas, de Fê, - uma ilustração, desde a folha de rosto, para cada conjunto de haicais -, reflete em seus traços a sensibilidade, a singeleza dos versos: pássaros, muitos e de todas as formas, ninhos, espantalhos com aves em seu esqueleto têm sua essência apreendida por linhas suaves e delicadas. Um modo “haicai” de ilustrar. Versos e imagens olham “para fora de nós mesmos, a observar a natureza, as mudanças da estação [...]” (RUIZ, 2008: 10).
mas fora de foco
voo do sabiá
(ARS, 2008, p. 37)
Sentimentos e sensações do eu poético, nos haicais de Ruiz e Rezende, são apenas sugeridos; os versos, em razão disso, podem parecer sem sentido, inacabados, solicitando mais intensamente o diálogo com os leitores:
rede de pescador
sem interromper o voo
o pássaro almoça
(ARS, 2008, p. 29)
O projeto gráfico-editorial de Conversa de passarinhos, de Ruiz e Rezende, também se mostra muito bem realizado. O azul escuro da capa é atenuado por pequenas figuras de pássaros, em tons alaranjados, pousados delicadamente no subtítulo, “Haikais para crianças de todas as idades”, como a sublinhar a amplitude dos leitores desejados. Na contracapa a emoção do sabiá, no haikai de Ruiz, dialoga com a do curió, nos versos de Rezende, ambos voltados para o sol. A delicadeza do conjunto da obra impressiona os sentidos do leitor: versos e ilustrações têm a mesma tessitura. A leitura visual dos poemas, de Fê, - uma ilustração, desde a folha de rosto, para cada conjunto de haicais -, reflete em seus traços a sensibilidade, a singeleza dos versos: pássaros, muitos e de todas as formas, ninhos, espantalhos com aves em seu esqueleto têm sua essência apreendida por linhas suaves e delicadas. Um modo “haicai” de ilustrar. Versos e imagens olham “para fora de nós mesmos, a observar a natureza, as mudanças da estação [...]” (RUIZ, 2008: 10).
Bela resenha. Obrigado.
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